O Preconceito no Ensino Médio
Entre as inúmeras dificuldades com que defronta a educação no Brasil encontra-se o preconceito contra os que não cursaram a universidade. São eles, por isso, considerados cidadãos de menor valor humano, menos capazes de uma função importante na sociedade. Não que se condene evidentemente a aspiração ao nível universitário, mas, deve-se admitir que há outras formas de realização pessoal. Pode-se viver de modo digno e produtivo atuando na área da arte, da tecnologia ou do serviço sem o ensino superior. O trabalho, por si só, como atividade que exige competência, pode garantir uma boa qualidade de vida seja no aspecto social, no econômico/financeiro, no exercício consciente da cidadania e especialmente no aprimoramento pessoal.
Por outro lado, encontra-se, com freqüência o aluno de nível médio que visa a Universidade somente pelo certificado, pelo título como se a sua simples posse pudesse alterar a sua vida. São universitários sem vocação que apenas cumprem tarefas sem maior interesse no estudo mas que chegam à formatura passando a ostentar o título como um troféu. Na prática, no entanto, vão muitas vezes exercer funções que dispensam esse nível de estudo.
O certificado de curso superior não deve ser visto como era no passado, o título de nobreza, muitas vezes comprado com grande esforço por visões ideológicas e preconceituosas, mas como uma modalidade de busca de conhecimento para o exercício de determinadas profissões. Claramente percebe-se o preconceito.
É por conta da desvalorização social dos que não cursaram o nível superior que se impõe a necessidade bastante questionável da universidade para todos. Tivesse o Ensino Médio um caráter terminal oferecendo a possibilidade de inserção no mercado de trabalho, não haveria a necessidade da universidade para a profissionalização. Somente os que desejassem uma profissão que exigisse estudos nesse nível iriam procurá-lo o que o tornaria mais exigente e objetivo.
Essa observação leva à necessidade de se repensar o Ensino Médio para que seja diversificado o seu objetivo e o seu currículo. Para que não somente prepare para a universidade e para o trabalho especializado mas especialmente, dê uma base geral de conhecimentos que permita outros modelos de profissionalização.
Só o preconceito justifica essa tendência homogenizadora e padronizadora do Ensino Médio. Não há porque não diversificar o seu currículo para que possa atender aos diferentes interesses do seu alunado.
É fundamental, numa sociedade democrática, respeito às diferenças, a oportunidade para todos. Por muito tempo o preconceito manifestou-se contra o ensino técnico que foi avaliado como um curso inferior, de caráter prático mais adequado às camadas mais desfavorecidas. Entende-se que além de preparar para a universidade e para o ensino técnico o ensino médio deve ter um currículo que contemple os que não pretendem nenhuma profissão especializada mas uma maior qualificação para o ingresso no mercado de trabalho que lhes permita uma vida digna integrada na sociedade com responsabilidade social a prática de cidadania.
A história da legislação sobre o Ensino Médio também deixa entrever o preconceito pela dicotomia que estabelece entre os distintos grupos sociais: um currículo propedêutico para os economicamente mais abastados que se destinariam ao Ensino Superior e outro visando a profissionalização para os menos favorecidos que necessitariam iniciar mais cedo o trabalho remunerado.
Os que escolhiam a profissionalização estariam premidos pela necessidade abrindo mão do objetivo ideal que seria a universidade. A entrada no mercado de trabalho logo após o Ensino Médio sempre foi vista como uma segunda opção, com um caminho menor, como uma via inferior para os economicamente mais carentes.
Só o preconceito explica a distorção de objetivos que levou o Ensino Médio a ser um curso preparatório para o ENEM e os vestibulares. Só o preconceito permite compreender a ideologia que apresenta a Universidade como a única forma de realização pessoal.
Vera Rudge Werneck
Vera Rudge Werneck